quinta-feira, 24 de julho de 2014

O verdadeiro poder da humanização

Muito se ouve falar sobre humanização hoje em dia, em diversas áreas, e especificamente na área de obstetrícia. É humanização do atendimento pra cá, humanização do parto pra lá, humanização do nascimento, etc. Mas, afinal, o que seria humanizar?

De acordo com o que vivencio no dia a dia de trabalho com a saúde da população, humanizar é tratar o outro como gostaríamos de ser tratados, é acolher como gostaríamos de ser acolhidos, é dar atenção, sorrir, ouvir, assim como gostaríamos que fizessem conosco. Ou seja, não basta falar baixo e não ofender, isso seria o mínimo para lidar dar com outras pessoas. A humanização vai além disso. É olhar para o outro com irmandade, de forma holística. Como vi no desenho um dia desses: não sei nem porque a palavra humanizar, se refere à palavra Humano, pois a definição não condiz com a palavra de origem.

Mesmo os profissionais que apoiam o tratamento humanizado, que dizem tentar agir com humanização, acabam falhando. Com a correria e contra-tempos do dia a dia, agimos de forma mecânica, de forma nada holística, como se tivéssemos uma tarefa para cumprir, na qual o objetivo é realiza-la por completo. E quando conseguimos realizar a tarefa e conseguimos, pelo menos,que ninguém reclame, nos damos como satisfeitos.

Para nós profissionais, aquele é só mais um atendimento, só mais um parto, só mais uma "mãezinha", só mais um bebê, só mais um dia de trabalho. Mas para cada mulher é um sentimento único em sua vida que ficará marcado para sempre. Para o bebê é o evento único de nascimento e boas-vindas ao mundo.

Um simples "toque" que é realizado de rotina nas maternidades (que serve para saber a dilatação do útero e a evolução do trabalho de parto), é realizado várias vezes por diferentes profissionais que quase sempre nem se apresentam à mulher. É realizado na frente do acompanhante sem nem sabermos se a gestante está à vontade naquela situação.

Muitas mulheres por não terem vínculo com o pai do bebê, ou não terem familiares próximos, levam para ser seu acompanhante um(a) vizinho(a), um irmão ou alguém não tão próximo. E aí, não pensamos se ela quer ser exposta ao lado dessa pessoa, se ela está a vontade para tirar a calcinha e "abrir bem as pernas" - como pedem muitos profissionais.

Não reparar esse tipo de situação que pode ser constrangedora para gestante, não ter esse cuidado, é uma forma de não estar agindo com a tão famosa humanização. Posso observar situações como essas corriqueiramente mesmo vindo dos melhores profissionais. Acaba acontecendo: uma palavra mal dita, uma frase mal colocada.

Um exemplo aconteceu esses dias na maternidade. Ao entrevistar uma paciente para preencher a ficha de internação, não tendo disponibilidade nas salas de atendimento, a profissional enfermeira (infelizmente), realizou a entrevista de longe, quase gritando, na sala onde estavam todas as outras pacientes aguardando atendimento. A enfermeira de um lado na mesa e todas as pacientes do outro lado da sala... E aí, chegou na pergunta: - Você usa ou usou drogas? Na boa, se eu usasse, com certeza eu não falaria ali... Mas, por sorte a paciente respondeu: sim! Como se não bastasse, a profissional continuou: - Qual?... Eu não acreditei e senti vergonha pela enfermeira, pela mulher e pelas outras pacientes...

Não consegui ouvir a resposta do local em que eu estava (que era dentro de uma sala), na verdade depois dessa, nem sei se a menina respondeu.

Esse tipo de postura não humanizada acontece em várias outras situações... Já vi comparar o nascimento do bebê com o de cachorrinhos, já ouvi dizer que alguns bebês saem igual a quiabo, e por aí vai...



Não julgo o profissional por isso, pois todos acabam fazendo isso em algum momento sem nem perceber. Talvez seja culpa do sistema, que muitas vezes visa o quantitativo de atendimentos , as estatísticas...Por isso acredito que nós profissionais, devamos sempre estar atentos a isso e nos policiar para sermos humanizados, por mais que isso pareça contraditório, com persistência conseguiremos nos "re"humanizar.

As mulheres, os familiares e a sociedade em geral tem que se conscientizar de seus direitos e exigir ser tratado com atenção, zelo, cautela e qualidade do atendimento, sempre.

Um simples olhar no olho que o profissional deixa de dar, uma cara feia ou julgamento que fazemos, ou uma chamada de forma rude em frente ao paciente e seus familiares marcam qualquer pessoa negativamente, principalmente às que estão com seu emocional abalado por influencias hormonais, com dores, medo, inseguranças e ansiedade .

Já conseguindo entender o contexto do que seria a humanização, podemos pensar, qual o objetivo disso tudo? Qual o impacto da humanização para a sociedade? Será somente proporcionar bons momentos aos outros? Essa seria uma reflexão bem filosófica e que traria bons debates... Eu não tinha parado para pensar sobre isso até sentir na prática qual o poder que a humanização tem.

O paciente está numa relação de poder onde o profissional é o lado mais forte. O paciente, é trabalhador, tem sua família, seus sofrimentos e naquele momento de fragilidade, tudo que podemos fazer por ele é acolher e tratar com dignidade.

Quando consigo fazer isso e vejo um sorriso ou um olhar de agradecimento, uma palavra profetizando benção de Deus, quando ouço um: " Ah que bom que é você aqui hoje..." Isso além de me fazer sentir bem , me faz acreditar mais num mundo de harmonia, de paz. Me faz sentir com o dever feito, o que me encoraja a seguir assim, semeando o amor. E o paciente também se sente assim, e semeia o amor aos seus próximos que porventura possam estar numa relação de poder inferior, seja um filho, ou um empregado.

E assim, na minha opinião, o poder da humanização é um efeito dominó de amor e paciência espalhado pelo mundo....

Abaixo encontra-se o link do Manual do Ministério da Saúde do caderno de Humanização do SUS.
É válido para as gestantes que querem conhecer os seus direitos oferecidos pelo SUS  e para os profissionais da saúde....
Ainda não li na íntegra por falta de tempo, mas pretendo ler em breve.

Caderno HumanizaSUS Ministério de saúde





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